A propósito de “Breaking the Ground” de Daniel Liebeskind
Num tom apelativo mas quase sempre simplista a escrita é pontuada por momentos de maior intensidade emocional, em que nos é revelado, por exemplo, que os arquitectos da cidade global se lamuriam e desrespeitam mutuamente, tão intensamente como os da aldeia, que já foi uma cidade, em que vivemos. Ou então, é-nos dado a conhecer, nas páginas 215-216 uma definição de ballet por William Forsyth, que Liebeskind não deixa de evocar como uma das mais certeiras definições de arquitectura. Tão certeira que só por ela a leitura deste livro vale e muito, a pena.
Num outro momento narrativo de forte carga emocional, a prisão do próprio pai, Liebeskind formula a imagem, quanto a mim, mais poderosa deste livro: o silêncio, o silêncio em que é gerado o nosso trabalho.
Para Liebeskind não existem duvidas: trabalha para o Povo de Nova York (no caso do Masterplan para o WTC), para o público e a apresentação e discussão das suas ideias é central no processo criativo. Mas será que é mesmo assim? Será que trabalhamos para alguém? Quando procuramos, com o nosso desenho e ainda não sabemos o quê, estamos a trabalhar para quem? Como é que o que ainda não está formulado, logo ainda não está dito nem o pode ser, pode ser dirigido a alguém?
Por outro lado, como existirá arquitectura (a arte maior que vai connosco para a casa de banho) sem alguém do outro lado do papel?
Liebeskind no seu incontido e muito americano optimismo, faz profissão de fé; existe alguém para ouvir e responder à canção cantada no buraco da parede da mais lúgubre prisão.
Porto, 29 de Março de 2007
João Castro Ferreira